domingo, agosto 29, 2004

o cheiro a maresia que me enche a alma



A onda

Era uma onda que crescera para lá do meio do mar
e mais se alçava em corpulência das ondas que tragava
pelo caminho. Era uma onda ávida.
Com ela rolavam búzios alucinados, estilhaços de
conchas, madeiros, plâncton, algas, o último alento dos
afogados... Era uma onda violenta.
A exaltação que trazia dos confins do horizonte nem
lhe dera para se interrogar sobre qual o desígnio do seu
destino. Era uma onda embriagada de vida.
Desfraldada em cachão, cavalgava para terra. A rojar-se
sobre os primeiros bancos de areia, esboçou enfim a
pergunta:
- Porquê?
Mas já não teve tempo de responder.


António Torrado
in Cinco sentidos e outros 1997

2 comentários:

Anónimo disse...

Adorei o teu blog, apenas digo numa palavra tudo o que ele merece, está soberbo, continua parabéns

Anónimo disse...

adorei... e este comentário destina-se ao blog em geral... as ondas vão e vêm, podem ser efémeras... (ou não) mas deixam sempre marcas... e qts de nos nao pousamos perto do mar para ver a dança das ondas... e na cabeça a dança das palavras...

rosto...

  rosto em silabas as artérias estão vazias dentro de mim. escuto gritos sucessivos e a sede é abandono em dias inúteis. o tempo é...